segunda-feira, 27 de julho de 2015

breve história de uma lontra distraída

Dona lontra foi à praia, sozinha, e passou a tarde a oscilar entre momentos de tranquilidade extrema e momentos de deprimência profunda. Dona lontra foi quase que expulsa da praia durante aquilo que mais parecia uma tempestade de areia. Dona lontra decidiu aproveitar para ir atestar o depósito e consolar o coração destroçado e as banhas num big mac. Dona lontra pensou até em comer no próprio macdonalds, mas avistou gente conhecida ainda antes de entrar. Dona lontra fez uma conta mentalmente e decidiu que não queria conversar porque se estava a sentir mal naquele vestido, com o cabelo desgrenhado e, de qualquer forma, aquelas pessoas nem sequer gostam de lontras. Dona lontra pede um big mac e sai, com a carteira, o telemóvel, as chaves do carro, o saco do hamburguer e a bebida nas mãos. Dona lontra pousa o ice tea de pêssego em cima do tejadilho do carro momentaneamente e instala-se dentro do mesmo. Dona lontra continua deprimida e pensa em comer ali mesmo, no parque de estacionamento, sozinha, dentro do carro. Dona lontra muda de ideias e decide ir para casa, comendo as batatas pelo caminho. Dona lontra pensa em ir aviando a bebida também porque, afinal, o gelo vai derreter até que a dona lontra chegue a casa e o ice tea vai estar ainda mais aguado. Mas a estúpida da dona lontra muda de ideias; arranca. Dona lontra entra na rotunda e ouve alguém a apitar - ainda pisca os olhos aflita, mas sabe que está a fazer tudo direitinho como manda a lei e parte do princípio de que não deve ser para si. Dona lontra prossegue. Dona lontra, a meio da autoestrada, entra em pânico: esqueceu-se de acondicionar a bebida e a esta hora já deve ter o banco encharcado. Dona lontra apalpa o banco. Nada. Dona lontra olha para o tapete do lado do pendura. Nada. Dona lontra reflete; o ice tea ficou no tejadilho do carro. Dona lontra percebe, finalmente, o porquê da buzinadela na rotunda: todos queriam um adereço daqueles. Mas o mais triste de tudo: dona lontra encostou, assim que saíu da autoestrada, e numa esperança vã e absurda, ainda foi confirmar, não fosse deus ter metido uma mãozinha ao copo e a bebida ainda estar lá, direitinha, em cima do tejadilho.

Nem deus lhe valeu, deixem-me que vos diga. Nem deus.

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