domingo, 28 de fevereiro de 2016

no que uma pessoa se torna

Tenho alma de lontra obesa desde que me lembro de mim, e uma tendência terrível para engordar; não fui presenteada com aquela lombriga que permite comer por oito obesos e continuar com a barriga colada às costas; a pessoa engole um bocadinho de ar sem querer e engorda logo três quilos.

Deixei o ginásio no início de fevereiro; não definitivamente mas porque contava ser operada muito em breve e porque me apercebi que, se não parasse, se não conversasse com pessoas, ia acabar por enlouquecer. Saltitar de casa para o estágio, do estágio para o ginásio e do ginásio para casa cansava-me o suficiente para que eu adormecesse cedo mas não mudava a forma como eu me sentia nas horas em que estava acordada e completamente entregue a mim mesma.

Foi a pior decisão que eu tomei; além de ter enfofinhado porque voltei para as aulas e continuei a comer, comecei a trepar paredes a meio do mês mas não quis dar o braço a torcer e pagar o mesmo, por duas semanas, que pago por um mês inteiro. Estacionei o cu e fiquei a contar os dias.

Isto para vos dizer que hoje me sinto uma prisioneira a fazer risquinhos na parede e a contar os dias até à liberdade - ainda é só depois de amanhã e eu já estou a morrer de vontade de arrumar a mala para voltar a levar o cu de lontra a ver o que é que é bom para a tosse. Oh deus.

#rebolandoocuparaumladoeparaooutro

Sabem aquelas pessoas deprimentes que dizem ao mundo o quão tristes estão e o quanto as coisas vão mal mas, quando acontece algo bom, ficam com tanto medo de que o diabo esteja a ver que nem ousam contar a ninguém? Pois, estou a tornar-me numa dessas pessoas.

Safoda: há dias bons, há dias felizes. Há notícias capazes de dissolverem duas semanas terríveis e meses de angústia; não é diretamente comigo, mas é como se fosse. Afinal, o que é que nos são aqueles de quem gostamos senão uma extenção de nós próprios?

acertou-me no fígado

As consequências dos nossos atos são sempre tão diversas e complexas que prever o futuro se torna numa coisa muito, muito difícil...

J. K. Rowling,
harry potter e o prisioneiro de azkaban 

sábado, 27 de fevereiro de 2016

sério

Essa minha obsessão pelas respostas é tão grande e tão grave que já cheguei a mandar um mail ao autor de um livro que li porque cheguei ao fim e fiquei frustradíssima desta vida - não dava para entender nada, não percebia o fim e nem sequer dava para ter a certeza de qual era a resposta ao enigma do livro.

(sim, ele respondeu; que a minha lista de dúvidas fazia todo o sentido, que ele próprio não encontrava solução para elas e que era mesmo assim. chateei-me!)

.

É difícil lidar com um não mas, para mim, não há nada que seja mais difícil do que interpretar a ausência total de uma resposta. Quando não há nem sim, nem não. Quando só resta o silêncio.

Não consigo ir tranquilamente à minha vidinha quando tenho dúvidas, quando há um milhão de coisas a torturar-me que eu não sei; não sei lidar com as pontas soltas, com o nó no peito de não conseguir entender nada do que se passa. As dúvidas dão lugar aos monstros que vivem na cabeça de cada um; dão-nos aso para imaginarmos o que quisermos e para administrarmos a nós próprios a dor que vamos sentir. Seja ou não essa a verdade. Valha ou não a pena.

O pior que me podem fazer é deixarem-me neste impasse, é darem-me tempo para ficar aqui a pensar no que raio terei feito de errado ou no porquê de ser sempre assim. O pior que me podem fazer é deixarem-me semanas e semanas à espera de que alguém retribua a minha sinceridade bruta e seja capaz de me dizer ou sim ou sopas.

Por mais deprimente que a imagem seja, eu já não sei o que é adormecer sem estar a chorar; as poucas horas que durmo são interrompidas em sobressalto, ora com sonhos ridículos ora com mais um par de horas a deprimir. Reprimo todos os pensamentos negativos durante o dia, quando estou acompanhada mas, sempre que estou sozinha, não lhes consigo escapar. 

A pessoa chora enquanto conduz, a pessoa chora no banho, a pessoa chora durante a noite, a pessoa chora quando fica cinco minutos sozinha. Durante meses, deixei que o problema dele me afetasse como só nos afetam os problemas de quem gostamos. Deixei-me sofrer, de mansinho, pela incerteza de uma recuperação, pelo medo, pela ânsia. Deixei que se juntasse a todos os meus problemas o desespero e as lágrimas de uma cirurgia de 6 horas que talvez não tenha resultados esperados, mais semanas e semanas a tentar manter a paciência por ele não dizer nada porque sabia que ele não estava em condições, mais o mesmo medo que ele tinha: quero o melhor para ele, porra. Custa-me muito pensar que ele pode não recuperar. Deixei-me sofrer, tal como qualquer portuguesa portuguesíssima, porque é assim que somos: entrega-se o coração de bandeja e vê-se no que dá.

Meses depois, está tudo igual menos ele, está tudo igual menos nós. Meses depois sinto que fui descartada por não servir, nem de apoio. Meses depois restam-me as dúvidas, resta-me o medo, resta-me ânsia, as lágrimas e as noites sem dormir: mas falta-me o beijinho, falta-me o ticas, falta-me o eu gosto muito de ti. Falta-me o pouco que ainda me trazia à tona depois de tanto tempo a ser puxada para o fundo; restam-me os dias iguais, sem sabor, e a dor crescente pela incerteza do que se passa. Por não saber de nada, por não saber o que fiz de tão errado. Por não conseguir compreender o porquê disto, o porquê de se ter esquecido de que continuo aqui, o porquê de me estar a magoar desta forma - quando sabe que isto é, de longe, o pior que ele me poderia ter feito e que nada me doeria mais.

sexta-feira, 26 de fevereiro de 2016

também tinha de me pronunciar


O mau gosto desta campanha é coisa para me ferir a vista e fazer sangrar da alma - quem é que se lembrou de meter este cor de rosa hediondo  como fundo? 

uma pessoa nem dorme descansada com estas coisas

Nada de desconforto? De uma tosse mais forte que o fizesse saltar como uma rolha numa garrafa de champanhe? Nada? Zerito?
Valha-me deus. 

quinta-feira, 25 de fevereiro de 2016

ah, é disto que eu preciso

Nunca pensei que chegaria o dia em que ia dar por mim a estudar física para relaxar, por ser a única maneira de me desligar um bocadinho dos meus dramas - tenho a dizer-vos que, se o moço me continua a dar desgostos destes, acabo em medicina.

being me

Se é improvável que aconteça às pessoas normais, então é certo que vai acontecer comigo. That's how it works.

terça-feira, 23 de fevereiro de 2016

coisas de que não me orgulho

Imaginem isto:

vocês vivem com uma gaja (ou com um gajo, wtv). A dada altura, ela passa-se com vocês mal entram em casa, por motivos que vocês nem entendem. Grita-vos. Grita muito com vocês por tudo o que lhe fizeram hoje, ontem e há 20 anos atrás. Se for preciso, gritam com vocês até pelo que vocês não fizeram, só porque elas estão inseguras e decidem atirar o barro à parede. Atiram-vos com um sapato à testa e choram baba e ranho. Fazem as malas e juram a pés juntos que vocês nunca mais lhes vão pôr a vista em cima; saem de casa.

Passam três dias a chorar e, ao quarto, recuperam a capacidade de raciocínio. Entendem o que disseram, compreendem que não deviam ter disparado três nanossegundos depois de vocês terem entrado em casa. Que valia a pena ouvir e que, se calhar, o vosso caso é mesmo mau - que é, senhores, que é - e que ficar zangada de cada vez que vocês inspiram com um bocadinho mais de força já é o fenómeno da tpm instalado o mês todo. E então querem voltar para casa - envergonhadas, que estão, usam a chavita que estava atrás da caixa de correio, instalam-se no vosso sofá e ficam a atirar-vos bombons, à distância, a ver se a coisa pega, sempre sem fazer demasiado barulho antes que vocês a atirem da janela. 

Ouçam a cinderela, porque a gaja sabe o que diz: nunca façam isto. É um tanto ou quanto ingrato e roça a bipolaridade; ou aprendem a controlar-se, ou mais vale não voltarem mesmo. Mas isto, claro, são vocês.

A cinderela volta porque é mesmo bipolar, desequilibrada e faz o que lhe apetece.

um beijinho especial

A quem se lembrou (finalmente!) de meter um cesto de lixo na casa de banho dos homens - podia dizer-vos que a uso por causa do meu bigode, mas não é verdade. Prefiro a casa de banho dos homens porque não costuma ter o tampo mijado e não tem um bidé o que, a não ser que o façam na sanita, torna pouco provável que ande lá alguém a lavar a genitália.

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2016

cinderela dá conselhos de beleza (a puta da ironia)

Em primeiro lugar, não quero que se assustem com o conteúdo do post; o facto de o meu blog andar ao abandono e mais deprimido do que a amiga florbela espanca já é mau que chegue, não precisamos de transformar o antro num centro de conselhos de beleza e anúncios a collants de mousse e outros que tais, nem tão pouco vou ser paga para vos escrever isto.

Há uns tempos, ocorreu-me que seria útil arranjar uma daquelas máquinas para aquecer a cera em casa. Ofereceram-me uma roll-on e a experiência não me cativou; de alguma forma, achei que uma panelinha para derreter discos de cera era exatamente o que faltava na minha vida. E era mesmo!

Como sou sovina e estupidamente cautelosa com a forma como gasto o meu dinheiro, andava a ponderar há algum tempo, mas nunca com interesse suficiente. Até que se deu o milagre das promoções - vi que a veet spawax ia estar a metade do preço e fiquei em pulgas. Nunca tinha visto nenhuma, na lojas de produtos de estética a menos de 20€, e pareceu-me que a veet podia ser uma boa ideia. Então, andei a ler tudo o que me apareceu à frente acerca das ditas máquinas, e acabei por arriscar.

Tenho a dizer-vos que estou realmente contente com o meu pequeno investimento. Tive algum receio de não ter coragem para inflingir tamanhas dores em mim própria, mas estou positivamente surpreendida, tanto com a máquina quanto com a minha coragem recém-descoberta.

O melhor é que a cera nunca aquece demasiado. Mantem-se sempre à mesma temperatura e não me obriga a soprar, como costuma acontecer nas esteticistas, para tentar não acabar com queimaduras de 2º grau. Quanto a dores, bem, não podemos esperar milagres. Dói pra caralho, ao nível de 20 foda-se's por minuto, mas a coisa até vai e saímos do pseudo-centro-de-estética-chez-nous com a certeza de que somos ninjas multifacetadas e que nascemos para combater o pêlo.

Isto tudo para vos dizer que, vierem aqui ter por estarem indecisas como eu estive, e com medo de investir numa máquina potencialmente inútil ou perigosa (ah! sim, eu passei por aqueles segundos de pânico em que temi puxar pêlo e pele e vísceras, mas não acontece), arrisquem. Eu, que tenho uma pele sensível ao ponto de usar cremes de bebé, estou fascinada com a ideia de nunca mais ter de me despir à frente de uma desconhecida que passa uma hora da vida dela a torturar-me com cera escaldante. Além de que, a avaliar pelo preço de cada ida a um destes antros de malvadez, compensa bastante - convém referir que cada recarga da veet, composta por 6 discos (o que, supostamente, será o suficiente uma depilação completa mas, confiem em mim, enquanto não se ajeitarem com a coisa, não dá), custa perto de 10€, mas a máquina não morre do coração se usarem cera mais barata, das lojas de produtos de estética.

Posto isto, não, não vos vou oferecer um cesto de shampôs da avon e um sabonete de leite de burra por terem chegado aqui. Vamos voltar à emissão normal e esquecer que eu, por momentos, parecia uma blogger féshón.

para acabar,

Uma corda estica até ao seu comprimento, mas pode passar uma vida inteira dobrada sobre si mesma, enrolada  para dentro. Uma corda comprida pode não passar de um pequeno rolo. A nossa vida também é assim, como uma corda. Por vezes estende-se sobre o abismo, por vezes está enrolada na arrecadação. Pode unir dois lugares distantes ou ficar arrumada, sobre si mesma.

Afonso Cruz,
jesus cristo bebia cerveja  

retratos.

Não somos os rótulos que nos põem, não somos o que um momento de loucura faz de nós - pelo menos gosto de pensar assim.

Numa das minhas passagens pelo hospital, em estágio, conheci um ex-presidiário. Comentava-se que tinha matado um homem e que isso lhe soubera a 10 anos preso; não sei e, honestamente, isso não me importa muito. 

Uma manhã, quando entrei no quarto dele com uma toalha lavada, remexi-lhe no tabuleiro do pequeno almoço; confessei-lhe que achava sempre piada às frases que vinham nos pacotes de açúcar da nicola, dos que dizem coisas como «bom dia a quem está de trombas», e nunca resistia a espreitar. Saí do quarto.

Algum tempo mais tarde, quando voltei para lhe trocar os lençóis, sorriu-me e estendeu-me o pacotinho do açúcar, agora vazio. «Como disseste que gostavas, guardei-o para ti, para se quiseres fazer coleção.» Aqueceu-me o coração.

Soube que morreu, uns meses mais tarde, e que as pessoas não lhe guardavam respeito; fiquei triste por ele e pelo funeral que, provavelmente, não foi glorioso. Eu não sei quem foi aquele homem antes daquela estadia inusitada no hospital, antes da doença que o consumiu. Talvez também não me interesse - o que guardo dele não é o passado de ex-presidiário ou os motivos que o levaram a matar alguém. Guardo-lhe o sorriso e um pacotinho de açúcar vazio.

domingo, 21 de fevereiro de 2016

outras dores

Custa-me aceitar que possa estar a perder alguém. Não consigo obrigar-me a entender que o cancro, o cabrão do cancro, pode estar mesmo a mastigar as vísceras de alguém que me viu crescer e a quem eu sou demasiado ligada para me imaginar a dizer-lhe adeus. Não há idade certa para morrer. Não há isso de «pelo menos já tinha uma idade avançada» quando é dos nossos que estamos a falar. E, então, relativizo; digo que as dores que ela diz sentir, as dores que já nem sabe diferenciar, são obra da cabeça, da crença de que já não dura muito, da ideia de que tem os dias contados. Fico zangada e embruteço sempre que alguém choraminga ao meu lado e me diz que não a tornaremos a ver; não quero que me façam pensar nisso, sentir isso, embora o pense e o sinta todos os dias e isso me amedronte. «Temos todos os dias contados desde que nascemos», disse-lhe um dia, não tanto por ser verdade, apesar de o ser, como para lhe afastar da ideia (da dela ou da minha?) de que, em breve, não poderemos voltar a sentar-nos à mesma mesa, a beber o café que eu me habituei, desde muito nova, a chamar de meu preferido, não tanto por ser francês e impossível de encontrar cá mas por ser o que mais me ligava a ela. Essa paixão eterna pela frança e pelo café.

É difícil habituarmo-nos à ideia de que, um dia, quem esteve sempre ao nosso lado já não nos voltará a aquecer as mãos, as nossas mãos eternamente geladas, entre as suas quentes, quentinhas, cheias de amor. E talvez até se dê o caso de as nossas mãos se gelarem de propósito, só para se voltarem a instalar naquela concha onde as vidas parecem eternas e o mundo parece não me querer roubar um pedaço de mim.

Despedi-me dela há umas semanas. Levaram-na para longe, para demasiado longe, para tratarem melhor dela. Essa distância é um vazio no peito e um medo constante; chorei da última vez que a vi. Chorei muito nesse momento, e nas horas que se seguiram - ainda choro, para vos ser sincera. Choro porque é difícil vermos alguém a definhar ao nosso lado, mas é ainda mais difícil termos alguém a definhar longe. E choro porque morro de medo de não a voltar a ver em vida, por mais que essa seja uma ideia que eu não aceite. Por mais que a imagem dela a perder-se dentro das roupas junto com todo o vigor que lhe era característico me diga que ela nunca mais vai voltar para mim como eu a conheci, como sempre foi.

Despedi-me dela há umas semanas e não sei se ela sabe o quanto ainda me dói o abraço forte que não lhe dei por já não ter coragem de apertar os ossos frágeis dela. Disse-lhe adeus mas ainda rezo para que tenha o significado de um até já - esperá-la-ei com uma caneca de café, cheia, a fumegar; foi sempre assim, e é assim que será para sempre.

sobre os leitores

Nunca consigo compreender o que vai na alma das criaturas que me dizem que eu devia aproveitar os meus tempos livres para descansar e não para me enfiar no meio dos meus livros - ler é a minha forma de descansar. Quando leio, os problemas da história só existem até eu fechar o livro.

E, depois, voltam os meus.

vão por mim, o livro é bom

Rosa nunca se sente única. Isso nunca lhe acontece na vida. Todos os seus momentos são minimizados com um "isso também já me aconteceu". A vida de rosa é partilhada por todos e não tem nada de único. Todos os seres humanos são únicos, menos rosa. Ela pertence a todos, como o pão da missa que se divide pela humanidade.

Afonso Cruz,
jesus cristo bebia cerveja 

dos melhores de sempre

... querendo dizer que as nossas dores nos acompanham até morrermos, como cães fiéis atrás dos donos. E, quando olhamos para baixo, vimos esses cães horríveis que nunca nos abandonam, que nos são leais até à morte.

Afonso Cruz,
jesus cristo bebia cerveja

a pausa no harry potter

- Olha, trouxe bolinhos de canela - diz rosa.
Ari está com os olhos cheios de montanhas e flores da primavera e não ouve nada, pois os olhos repletos de coisas dão cabo do que se ouve.
- Trouxe bolinhos...
Ari levanta-se e sorri, pega em três ou quatro de uma vez e empurra-os para dentro da boca.
- Não sabem a canela.
- Estes não sabem.
- Não há bolos de canela que não sabem a canela.
- Claro que há. Tal como há pessoas velhas que morrem novas e há horas que passam em segundos e há sonhos que acontecem quando estamos acordados, há bolos de canela que não sabem a canela.

Afonso Cruz,
jesus cristo bebia cerveja

sobre as pessoas que nos morrem em vida

A vida das pessoas acaba assim, e matilde nem sequer tem consciência de que morreu uma das suas mortes. De cada vez que deixamos de ser percebidos, morremos. Quando somos enterrados deixamos de ser percebidos por toda a gente, mas quando os outros já não olham para nós, ficaram condenados para um número limitado de pessoas, a uma morte em tudo idêntica à outra. A nossa morte não acontece quando somos enterrados, acontece continuamente: os dentes caem, os joelhos solidificam, a pele engelha-se, os amigos partem. Tudo isso é a morte. O momento final é apenas isso, um momento.

Afonso Cruz,
jesus cristo bebia cerveja

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2016

esta pessoa

Gostava, adorava, não transformar o pobre do cinderela no muro das lamentações mas a verdade é que os meus dias têm sido tão maus e eu estou tão em baixo que não me resta disposição para escrever. Nem vontade. Nem assuntos. 

Se resumir o meu dia, resulta nisto: hoje chorei - e nos outros dias todos também. Mas chorei um bocadinho mais porque perdi as mensagens que tinha e que me faziam lembrar de que houve tempos bons, e porque me livrei de objetos que só me faziam lembrar dele e porque, foda-se, isto não fica mais fácil com o passar dos dias, só se torna mais real! E dói-me o estômago. Muito mesmo. Estou mal disposta e à beira de vomitar em cima do teclado.

Por hoje é só isto.

terça-feira, 16 de fevereiro de 2016

marés

Há coisas que nunca perdoamos. Fingimos esquecer, durante uns momentos, mas nunca perdoamos realmente - e eu não sou capaz de perdoar os anos em que fui gozada, humilhada, posta de lado. Não perdoo o que isso me fez.

Demorei muito tempo a ter coragem de sair de casa maquilhada. Não que não gostasse de me ver - mas tinha medo. Tinha medo que pudessem pensar que eu tinha a ilusão de que ficaria bonita se estivesse maquilhada; acreditem, não tinha. Mas sentia-me menos feia, e mais normal dentro daquele que achei que seria o comportamento padrão de uma miúda. Demorei anos a aprender que não fazia mal, também tinha direito a ser menina como as outras.

Passei muitos anos a fugir; aconteceram-me coisas más. Quando temos 15 anos e todos aqueles que pareciam nossos amigos decidem humilhar-nos e, não contentes, metem quase todas as turmas do nosso ano a fazer o mesmo, parece o fim do mundo. Aos 20 sabemos que não é, mas que deixou marcas; sou muito mais desconfiada, desde aí. Tenho medo de confiar, de me entregar, e disparo à primeira dúvida: o medo tornou-me implacável. Doentia, talvez. Fujo das pessoas, perco-as - e às vezes nem tenho razão.

Aos 16 anos, almoçava às escondidas na biblioteca da escola. Por vezes, na casa de banho. Tinha medo de ser vista sozinha porque isso me tornava mais vulnerável, mais ridícula, mais hey-olhem-sou-demasiado-anormal-para-ter-amigos - era assim que eu me sentia. E, de certa forma, ainda é.

Ainda baixo o olhar se um rapaz bonito olhar para mim, mesmo que tenha sido sem querer e ele nem tenha dado por mim. Ainda fujo, ainda sinto vergonha. Ainda me escondo sempre que tenho de passar por um grupo de gente da minha idade; tenho medo de que recomece. De ser gozada outra vez, porque nada mudou. Porque, aos 18, vivi um dos piores dias da minha vida quando me disseram que não haveria volta a dar e teria mesmo de acostumar-me a viver assim. Teria de aprender que seria anormal a vida toda, que nunca me sentiria completamente bem porque há um fantasma, um passado sempre presente, uma malformação que se instalou para viver tantos anos quanto eu.

Eu nunca vou ser a menina bonita, com ou sem maquilhagem. Vou continuar como até aqui: a colecionar histórias falhadas, pessoas perdidas e noites sem dormir porque nem o meu melhor é o suficiente; o meu melhor não muda o que sou, não muda o que sinto. E também não me deixa dormir - nunca vou ser a menina bonita de ninguém, nem para mim mesma, porque mais do que sê-lo, seria preciso que eu o sentisse. E não sinto: sabotaram-me os anos em que eu devia ter aprendido a aceitar-me. Ensinaram-me que sou feia, que sou anormal, que não valho nada, e foi essa a lição que aprendi sobre mim mesma e que não consigo esquecer.

É por isto, só por isto, que há coisas que nunca perdoamos.

segunda-feira, 15 de fevereiro de 2016

o dia após o dia dos namorados, porque é assim que isto anda

Para melhorar os meus dias, o meu telemóvel começou a ter ataques esquizofrénicos e precisa urgentemente de ir para o arranjo, antes que me dê uma crise daquelas e o atire para testar a profundidade das cheias - mas depois levanta-se todo um outro problema.

Eu sou portuguesíssima, daquelas que sofrem de amores e de saudades, das que se torturam com fotos e mensagens antigas só para terem mais um bocadinho de quem se perdeu; e é isso, numa altura em que o perdi, sei que, mandando o bicho para arranjo, vou perder o que me resta do rapaz. E ainda não estou pronta para desfazer-me dele.

Olhem... dilemas.

domingo, 14 de fevereiro de 2016

em dia dos namorados

[aos que choramingaram hoje, todo o santo dia, porque é dia dos namorados e parece ainda mais deprimente estar sozinho:

esta pessoa tinha alguém ontem à noite. esta pessoa pensava que tinha o mocinho de quem gosta do lado dela. mas deus não gosta desta pessoa, deus gosta de lhe moer o juízo - e, tudo o que havia, evaporou-se. pufff. esta noite.
a pessoa chorou copiosamente até às cinco da manhã, a pessoa escreveu mensagens furiosas que a fazem recomeçar a chorar de cada vez que as lê - mas, depois de umas horitas de sono, a pessoa parece estar só muito mal humorada, o que pode ser causado por este tempo. a pessoa tem estado a tentar; evitou falar sobre o assunto, logo após ter metido alguém ao corrente, só porque era importante, em caso de suicídio, alguém saber. a pessoa devia ter tido um dia produtivo mas teve um dia de merda, não fez nada e agora tem mais um problema para resolver.

a noite é sempre a pior parte - sou obrigada a assumir que não adianta esperar. ele não vai voltar. não me vai ligar. acabou. desta vez não há volta a dar, como de todas as outras vezes. não há desculpa, não há um eu gosto muito de ti, não há uma promessa de que vamos acertar as agulhas.

há só o vazio, o silêncio, a dor. o arrependimento. as saudades. a incerteza se esta terá sido, ou não, a melhor decisão. o medo de que ele não recupere, a agústia de ter de aceitar que não vou saber o desfecho do caso dele. e o facto de, apesar de tudo, continuar com os dedos cruzados, a torcer para que tudo corra bem. para que ele recupere, e para que seja muito feliz.

continua a ser a pessoa que conseguiu mais de mim. o primeiro a conseguir que eu me entregasse, que confiasse, que apostasse. devo-lhe muito. devo-lhe quase tudo, e um período de felicidade. mais de um ano em que o meu mundo foi melhor só por ele fazer parte dele. vai fazer-me falta, o meu menino. mas foi melhor assim. pelo menos, acho que sim.

embora o adore.
e a pessoa recomeçou a chorar.]

sábado, 13 de fevereiro de 2016

em véspera de dia dos namorados

No hospital onde estagiei não se pode dizer que houvesse muita gente a fazer as delícias da minha vista - mas há um mocinho jeitoso que, felizmente, trabalha logo na portaria e, nos dias em que ele entrava à mesma hora que eu, parecia natal. 

Claro que nunca cheguei a saber o nome da criatura, até porque nunca me interessei que chegue para isso. É, sei lá, imaginem qualquer coisa tipo uma montra com uma imagem do papa joão paulo II, esculpida em cera, com quase dois metros de altura, vestido de bailarina clássica e vocês acham piada à coisa e passam por lá muitas vezes porque gostam de mirar a estátua, mas nunca chegam a entrar na loja para perguntar o preço porque sabem que não precisam daquilo para nada nem tinham espaço para um mamarracho daqueles lá em casa. Era mais ou menos isto, mas eu tinha espaço de sobra na minha cama e um coração gigante para o albergar.

Quis o destino que eu, hoje, andasse aqui a fazer umas investigações por conta própria (aka, satisfazer os desejos da minha curiosidade) e encontrasse, por acaso, um moço giro que só ele. Convenhamos que, muito embora o meu moço seja ciumento, uma pessoa pode, e deve, sempre permitir-se a orgasmos cerebrais múltiplos quando encontra uma peça de arte destas. E depois esse tem um amigo. E o amigo é giro. E aquela tromba é-me estupidamente familiar.

Foi assim que eu descobri o nome do mocinho giro do hospital.
E o da namorada também.


(mas tem uma namorada plus size e ficam adoráveis juntos, so i got that going for me)

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2016

up & down

Costumo dizer a mim mesma que as coisas más equilibram o mundo e que são precisos dias terríveis para nos ensinar a ser felizes nos dias menos maus - mas esta é só uma daquelas teorias bonitas formuladas num desses dias bons, ou quase-bons.

Os últimos meses têm sido um carrocel. Um daqueles carrocéis de que, num momento, parecemos gostar e, no momento seguinte, nos apetece perder todo o amor à pouca dignidade que tinha decidido andar nele connosco e meter-nos aos gritos para pararem aquela merda. Queremos sair. Queremos respirar fundo fora do drama, do medo, da incerteza. E depois podemos voltar. Ou não.

Talvez isto seja deus a relembrar-me de que não me curte, talvez seja o murphy a confirmar se a teoria dele estava certa - seja qual for a hipótese, espero que fique claro que eu já percebi, podem parar. 

terça-feira, 9 de fevereiro de 2016

home is... isso mesmo.

É engraçado: apesar de ter a consciência, desde muito pequena, de que queria enveredar pela área da saúde, acho que nunca pensei realmente no que isso implicava para alguém como eu, tão socially awkward, tão não-tenho-paciência-para-aturar-isto, sempre tão cheia de as-pessoas-não-vão-gostar-de-mim-porque-sou-diferente.

É engraçado como as pessoas mudam. Ou crescem. Ou, sei lá, têm de facto um lado oculto dentro delas que só desperta na altura certa; não vos sei explicar o que é que me tornou em alguém que consegue que as pessoas gostem dela, sem o mínimo esforço. Porque é, talvez, isso que mais me surpreende: não tenho de me esforçar. Faço o que acho que tenho de fazer, mesmo quando isso vai contra as regras impostas pela frieza que se apodera de quem faz isto há anos.

Uma parte de mim, teme que um dia eu deixe de tentar ser sempre o anjo da guarda que faz as vontades aos doentes quando ninguém está a ver; uma parte de mim teme que, também eu, um dia, olhe para as pessoas como objetos de trabalho e não como pessoas debilitadas que precisam da minha ajuda. Uma parte de mim, juro-vos, está a morrer de medo que eu me entregue também à lei do menor esforço, que ache que já faço que chegue por dar um banho e fazer a cama de alguém. Ou que deixe de envergar um sorriso como parte essencial da farda. 

A outra parte, está descansada da vida: eu quis isto. Minto. Quis enfermagem mas, quando vi que não seria assim tão simples, vi nas auxiliares uma luz ao fundo do túnel e fui percebendo, com o tempo, que esta era uma porta aberta. Que, ao começar por aqui, facilitei muito mais a minha vida do que poderia ter pensado inicialmente: e eu quis isto. E quero. Não posso dizer que meter arrastadeiras seja divertido ou que apanhar merda à mão é um emprego de sonho - acreditem que não é. Mas, mesmo nesses momentos, eu sei porque estou ali; há sempre pessoas que me sorriem e dizem, baixinho, que era bom que fossem todas como eu. Ouço-os dizer que estou sempre bem disposta e entendo que, mais do que nunca, aprendi a despir os problemas antes de vestir a farda e ninguém soube que fui dar uma volta ao inferno nos últimos tempos - orgulho-me disso.

Pela primeira vez, nos meus 20 anos de existência, senti orgulho naquilo em que me tornei. Senti que estava exatamente onde deveria estar e que tenho muito mais jeito para ajudar os outros do que algum dia poderia pensar. Eu quis isto: faço-o porque quero. E porque, imaginem só, me faz feliz.

o problema não és tu, sou eu.

Entendes que a tua alma se entregou realmente às ciências quando, apesar de teres escolhido esse caminho no secudário ter sido má ideia, agora que fugiste da rota ficas em pulgas com o facto de ires ter biologia logo pela manhã.

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2016

e, a isto, eu assisto diariamente

Há uns meses, acusaram-me de ser sovina pelos motivos mais ridículos que possam imaginar - e hoje, a história das promoções fez-me refletir sobre isso novamente. Tenho a dizer-vos que, afinal, sou orgulhosamente sovina por motivos de que me orgulho.

Tenho dinheiro. Não muito, mas inteiramente meu e completamente à minha disposição para fazer o que quiser dele. Podia dar-me a pequenos luxos, podia permitir-me algumas futilidades, mas não o faço; ainda não sei bem o que quero fazer a seguir, mas sei que quero mais, muito mais, e que não o posso fazer sem dinheiro. Sou cheia de sonhos e objetivos, e não tenciono depender de ninguém para os atingir; não, não quero depender dos meus pais até aos 30. Pelo contrário, acho que começa a ser hora de retribuir tudo o que já fizeram por mim.

Desta feita, confesso, nunca gasto dinheiro sem pensar no abalo que será para a minha conta. Não passo o cartão sem pensar duas vezes, raramente compro coisas de que não preciso realmente, mas fico realmente feliz quando faço compras para casa. Fico contente quando sinto que estou a contribuir. Estranho? Não me parece.

É por isto que não entendo a necessidade que as pessoas têm de fazer de conta que têm mais dinheiro do que o que têm na realidade. As que, como diz o outro, vivem acima das possibilidades e acabam a depender de esmolas para conseguirem manter um estilo de vida que, claramente, não têm como sustentar. Gente que, assim que sabe que vai ganhar 10, já está a pensar onde vai gastar 30€. Gente que se queixa de que nunca tem dinheiro mas também nunca faz um esforço para poupar, que não sabe o que é ter dois euros porque gastou o primeiro assim que lhe caíu na mão.

Nunca emprestem dinheiro a pessoas que dependem das vossas moedinhas; perguntem-lhe antes onde gastaram o que falta, e porque é que insistiram em comprar aquilo que não tinham como pagar. Não confiem em gente que vos olha de lado por saber que poupam e que contam cada cêntimo que gastam: acreditem que não são vocês que estão errados por quererem ser autossuficientes, em vez de uns esbanjadores incapazes de compreender que ir a todo o lado, contando com dinheiro emprestado, que nunca chegam a devolver. Isso não faz deles fixes nem pobres coitados. Faz deles uns parasitas inúteis que só vão chegar onde a boleia os levar.

E, a sério, não é longe.

sabes que cresceste quando

As promoções.
As promoções de todos os supermercados das redondezas; conhece-las quase melhor do que a tua mãe, e sabes que é difícil. Deliras quando as promoções coincidem com as tuas necessidades. Deliras também quando não coincidem. Tornaste mestre na arte de comprar barato; ficas frustrado quando percebes que te enganaste e podias ter poupado dois cêntimos.
As promoções, a febre das promoções - e uma veet spawax a metade do preço que me anda a fazer frenezim desde que vi o folheto, há não sei quanto tempo.
Mas é amanhã!

sabes que cresceste quando

Tens um dia que poderia ser de descanso e, em vez de assolapares a peida no sofá e ficares a devorar filmes ou livros como há uns anos atrás terias feito, aproveitas as horas de liberdade para lides domésticas divertidíssimas - e dás por ti a limpar, a arrumar e a organizar tudo para te tornar a vida mais fácil durante os outros dias em que não tens tempo.

I'm ready to be a mommy now.
(ou não. ou não.)

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2016

não faleci,

E juro que vos escreveria mais vezes, se a minha internet cooperasse e não fosse abaixo tantas vezes que eu acabo por desistir.

Rezem por ela, e eu voltarei depois.